segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O Vazio de um Mundo

Como agora, a noite era bela. As folhas da única árvore de minha rua brincavam entre si. Sei que posso parecer orgulhoso, mas realmente sou, por ter a única árvore de minha rua - a única árvore de meu bairro - à frente de minha casa. Devo ter muita sorte também, por ela estar de frente para a minha janela. Janela que em várias noites suportou o peso de meus pesados braços.
Estava bela e fria, grande noite. A meia luz do poste em frente refletiam agora as folhas, o vento fazia com que as parecessem dançar em uma intensa melodia. O movimento da árvore e o leve som do frio, me entorpeciam. Meus pensamentos moviam-se no mesmo ritmo, me deixando por alguns segundos confuso, sem saber no que exatamente pensar, fazer ou sonhar.
Recorri ao meu canto, que por muito tempo foi meu refúgio e hoje torna-se minha fonte. Fonte de inspiração, que é todo o ar que respiro. Sentado e olhando pela janela, toco o chão com a ponta de meus dedos apenas, para sentir o chão gelado; assim como fico a arranhar com minhas curtas unhas a escrevaninha, a procura de um som que combine com o uivo distante do vento e com o farfalhar das folhas. Tinta e papel.
Sobrou-me o resto de tudo, sobrei-me. Como poderia fazer a tinta tatuar minhas sobras? Sobras de nada. Era o que me acalmava por inteiro. Minha primeira e última saída. O papel refleteria a árvore, a meia luz do poste, meus pensamentos vazios, o som do frio, as minhas mão trêmulas. Comecei pelo olhar, não sabia em certo o que saíria após aquilo, porém meus olhos interiores, ou o par de olhos que me seguiam estavam ali como a fonte que transbordaria todas as outras expressões.
Decidi esperar, pois certa vez ouvi que o tempo nos ensina muitas coisas. Imaginei que toda a sobra de nada que resta em mim poderia completar se eu esperasse. Realmente acho que minha cama, meu armário e o quadro de um triste palhaço que pintei quando tinha 6 anos não se queixariam caso dedicasse essa noite ao meu canto... ao meu refúgio... à combinação harmônica entre cadeira, mesa, tinta, papel e uns três ou quatro livros que reinam ao meu lado. Parei de pensar. Deixei de admirar as estrelas e passei a encarar a folha - que também me encarava.
Os olhos desenhados, apesar de ter feição triste, traziam-me boas lembranças. Lembranças oca talvez de acontecimentos que nunca existiram, ou que sim, existiram apenas comigo, perante os meus pensamentos. Levantei-me, apaguei a luz do quarto, e apenas com as luzes da rua, que clariavam-me mal, permiti que minhas expressões fossem aleatórias, e desconhecidas dos meus próprios olhos, por isso havia proposto o escuro. Com cuidado, tentei explorar o resto do branco da folha, e inconscientemente era como se tudo aqui fosse um aviso a mim mesmo.
Essas coisas não se pensam, não são entendidas. São apenas sentidas. Sou um eterno explorador de sentidos, sensações e sentimentos. Agora o que mais preciso é achar um sentido para a voz que grita silenciosamente em meus ouvidos. Uma sensação diferente desse frio. Um sentimento novo, usado, emprestado, vermelho e azul.
Acabara de perder algumas horas da minha rotina, tentando descobrir o que realmente deveria estar no papel. Dobrei-o, ainda no escuro, e não me interessei para ver o que havia se formado. Coloquei-o embaixo da minha cama, por alguns segundos agradeci minha sorte e pela árvore que traria-me bons sonhos nessa noite, deitei-me...

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